Futebol brasileiro enterra a mística da camisa 10 construída com Pelé no Santos e seleção
   23 de agosto de 2021   │     13:00  │  0

Ex-jogadores e alguns técnicos lamentam que a “modernização” no mundo da bola esteja extinguindo uma referência tão importante em campo.

O Palmeiras chegou à semifinal da Copa Libertadores após vitória tranquila sobre o São Paulo, por 3 a 0, no Allianz Parque. A história poderia ser diferente caso Pablo aproveitasse um lance capital e raro dentro da área, dizem alguns são-paulinos. Quando o placar marcava 1 a 0, Emiliano Rigoni deu passe por entre os zagueiros palmeirenses, deixando o atacante na cara do gol.

“Assustado”, ele mandou a bola para o alto. O responsável por balançar as redes não esperava o passe de excelência do argentino. Lances assim, dos famosos cabeças pensantes, são cada vez mais raros entre os brasileiros. Além da falta desse tipo de jogador, uma conclusão pode ser percebida no futebol nacional, e também mundial: a mística da camisa 10 está desaparecendo. O Palmeiras não tinha um 10 em campo nesse jogo. O 10 do São Paulo era Daniel Alves, que atuou na lateral.

Quem deu peso para a camisa 10 foi Pelé, quando passou a usá-la no Santos e depois na seleção brasileira. Antes dele, a numeração dos uniformes não era assim. A partir de Pelé, o 10 passou a ser encarado como o craque do time, os mais bem pagos e aquele com o qual os marcadores deveriam se preocupar. A partir daí, uma legião de astros bons de bola começaram a usar a10. Dois argentinos fizeram história com ela: Maradona e Messi. Zico vestia a 10. Rivellino também, assim como Tostão e Jairzinho e Ademir da Guia. Mais recentemente, ela foi de Raí e Ronaldinho Gaúcho. Messi a usou no Barcelona por anos. Alguns excepcionais preferiram não se valer dela, como Cruyff e Cristiano Ronaldo – esse último por causa também de campanhas de marketing, a do CR7.

Também era dado ao camisa 10 a missão de cobrar as faltas. Talento do time, era inadmissível que um jogador que vestisse o número místico no futebol não soube cobrar com perfeição os tiros livres. Rivaldo sabia fazer isso com categoria. Ronaldinho Gaúcho também. Foi ele, aliás, que inventou a cobrança por baixo da barreira quando todos pulam. Obrigou, com isso, que os times colocassem um jogador deitado no chão, em posição nada confortável para um atleta, atrás da ‘muralha’, que seguiu saltando com segurança.

Prova também que o futebol brasileiro não dá mais bola para quem vai usar a camisa 10 é a falta de meias mais criativos nas equipes. Nas bases, poucos sobem com essa condição, o que faz com que os clubes importem alguns atletas com essas características e capazes de resgatar a magia do uniforme dentro de campo. Benítez, do São Paulo, é um desses estrangeiros com alguma pegada nesse sentido. O Atlético-MG tem o bom Nacho Fernández. E o Santos poderia ter em Carlos Sánchez esse atleta. Por tempos, os jogadores também sentiram o uso da camisa. Eram os mais cobrados pela torcida.

Com o futebol cada vez mais se destacando pela força física, os jovens se importam mais em receber a bola, dominar e servir um companheiro. “A visão diferenciada está em decadência. Neymar, no Paris Saint-Germain, é o único brasileiro que honra a camisa 10. Mas é atacante de origem. O fato é que deram muitas funções ao camisa 10”, afirma Paulo Rink. Então, ele poderia ser qualquer um. Como é atualmente.

Blog com informações do Estadão