O incrível caso do Flamengo, o time que não pode ser menos que ótimo
   29 de abril de 2021   │     13:00  │  0

Quarteto ofensivo do Flamengo comemora um dos gols – (Foto: André Durão)

Rubro-negro é mais bem visto no exterior do que com sua própria torcida no Brasil.

Flamengo europeu. Essa é a imagem do Flamengo para o mercado sul-americano. Desde o início da Libertadores nossos vizinhos celebram o futebol apresentado pelo campeão continental de 2019, seja por seu plano tático, seja por seus talentos individuais.

Enquanto a América valoriza o jogo do rubro-negro, parte da torcida reclama por “Fora Rogério Ceni”. “Éverton Ribeiro precisa do banco”. “Arão não é zagueiro”. “Vitinho não”. “Bruno Henrique tá mal demais”…

Jornalistas como o chileno Gonzalo Fouillioux e o argentino Pablo Carrozza se posicionaram sobre o futebol do time carioca. Para o comentarista chileno Foullioux “o Flamengo é uma equipe que poderia jogar a Champions mas está jogando a Libertadores”. Para o argentino Carroza “o Flamengo é a melhor equipe do continente e o quarteto de ataque seria titular em qualquer time europeu”. Declarações fortíssimas, que muitos no Brasil não teriam coragem de fazer.

Isso porque o próprio torcedor do Flamengo parece desvalorizar o talento, a construção tática e a reinvenção de um time que se mantém no topo há mais de dois anos, com 11 títulos conquistados – entre eles o bicampeonato Brasileiro e Taça Libertadores. A impressão que passa é que o erro é inadmissível e o mínimo aceitável é conquistar todos os títulos disputados.

Um ponto importante nessa balança aparenta óbvio: o time de Rogério Ceni não é o time de Jorge Jesus. Há fases diferentes no pensamento do que é o jogo e praticamente não há similaridade alguma entre os sistemas.

Até na saída de bola, que ambos fazem com linha de 3 defensores, é diferente: com Jorge Jesus, William Arão entrava entre os zagueiros, que abriam para as laterais (Rodrigo Caio pela direita e Pablo Marí pela esquerda).

Com Rogério Ceni, a linha de 3 é feita com William Arão pela direita, Rodrigo Caio por dentro e Filipe Luís pela esquerda, liberando Isla para ser quase um ponta-direita.

A construção ofensiva do time de Rogério Ceni se assemelha muito com o que Guardiola faz no City ou Tite faz na Seleção Brasileira. Um plano tático e um sistema que privilegia o talento, quer a posse de bola e tenta a todo momento o gol adversário, mas que se baseia na individualidade no último terço do campo – e não nas conexões.

É a melhor forma de jogar do mundo? É a pior? Há diversas maneiras de se jogar futebol e não existe uma fórmula mágica.

Há, porém, um ponto crucial nas críticas ao trabalho do Rogério Ceni no Flamengo. O time tem blocos distantes, entre defesa e ataque, o que facilita o jogo de contra-ataque (ou transição) do adversário. Isso dá a impressão de time frágil, que muitas vezes oferece espaço entre os setores. Fora isso, toda crítica soa como exagerada.

A qualidade da linha de jogadores do Flamengo é de causar inveja. Diego Alves, Isla, Rodrigo Caio, Filipe Luís, Thiago Maia, Diego, Éverton Ribeiro, Arrascaeta, Bruno Henrique, Gabriel Barbosa, Pedro… todos jogadores com passagens importantes por suas seleções nacionais.

Sentiram falta do Gerson nessa lista? O termômetro do meio-campo, o jogador mais regular, quem dita o ritmo de jogo… mas que ainda não foi convocado para uma partida oficial da Seleção. O talento individual oferece uma gama de qualidades, coisa rara no cenário sul-americano.

Se ainda vivo, Nelson Rodrigues qualificaria a reação da torcida como complexo de vira-lata: “O brasileiro é um Narciso às avessas, que cospe na própria imagem”, dizia o escritor. A admiração estrangeira pelo futebol apresentado pelo Flamengo é um reconhecimento genuíno.

Blog com ge.globo