É preciso ter muito cuidado para comparar Messi a Pelé
   15 de janeiro de 2016   │     0:04  │  0

Há poucos anos atrás, se você falasse que algum jogador da atualidade era ao menos tão bom quanto um dia foi Pelé, seria execrado. Afirmar que alguém era melhor? Caso para internação! E muito provavelmente com justiça, afinal de contas o Rei do Futebol era incontestável. Após pendurar as chuteiras, em amistoso entre Cosmos e Santos, vários craques chegaram a ser comparados com o Atleta do Século em determinado momento de suas carreiras.

Na década de 1980 aconteceu com Zico e Maradona. Alguns anos depois, mais precisamente em 2006, a queda de rendimento de Ronaldinho Gaúcho iniciou quando começaram a compará-lo ao eterno camisa 10 da Vila Belmiro. A posição de Pelé seguia inabalável em seu trono, para a felicidade de Edson Arantes do Nascimento. Mas a incrível ascensão de Lionel Messi mudou o tom da discussão.

Gols, recordes, assistências, dribles, vitórias e títulos – muitos títulos. As exibições espetaculares Europa afora renderam a Messi quatro Bolas de Ouro consecutivas, e se antes Maradona era inabalável na posição de maior jogador argentino da história, a discussão passou a ser separada: Dieguito manteve sua posição no topo como o nº 1 da Seleção Argentina, e o mais amado de seu país. Tecnicamente, a discussão já rumava para outro lado. Quem diria!

Após críticas pelo seu desempenho vestindo a camisa da Albiceleste, Messi voltou a colocar em dúvida a sua posição como terráqueo: na última temporada, com ajuda de Neymar, Suárez e Iniesta, foi decisivo e surpreendeu os que achavam ser impossível manter uma regularidade tão alta. Os títulos de Copa do Rei, La Liga e Champions League já anunciavam que a quinta Bola de Ouro estava a caminho.

E ela veio na última segunda-feira. Se na imprensa europeia já o tratavam como ‘melhor da história’, no Brasil a discussão também mudou de tom. Pela primeira vez, a posição de Pelé está realmente em risco. Mas na hora de comparar é preciso cuidado, afinal de contas o papel exercido pelo tricampeão mundial ultrapassa a barreira dos gramados.

Desde o jogo que o apresentou ao mundo, na Copa de 1958, contra a União Soviética, até o dia em que pendurou as chuteiras, em 1977, no Giants Stadium de Nova York, Pelé ultrapassou barreiras inéditas até então. Esqueça por um breve momento as comparações em títulos e gols marcados: quando Pelé jogava, o mundo era outro – muito maior, com poucas imagens em relação a hoje. O Brasil era um desconhecido e curioso canto situado na América do Sul.

Foi graças a Pelé (e a outros grandes craques, é verdade, mas o mineiro de Três Corações era a grande estrela) que o Brasil passou a ser mais reconhecido. Em um tempo sem internet, YouTube, Facebook e Twitter, Edson Arantes do Nascimento já era a personalidade globalmente mais conhecida. Um brasileiro, quem diria!

O talento de Pelé fez com que grupos rivais interrompessem uma guerra na África só para vê-lo jogar; fez com que um juiz fosse ‘expulso’ na Colômbia por ter lhe mostrado um cartão vermelho que enfureceu o público no estádio El Campín, em Bogotá; popularizou o ‘soccer’ nos Estados Unidos e fez com que duas das maiores empresas de material esportivo do mundo fizessem um pacto (posteriormente quebrado) para não o contratar – afinal de contas, a sua simples imagem acabaria com todo o equilíbrio.

Com a bola nos pés, Lionel Messi pode sim um dia superar Pelé. Entretanto, não vai conseguir igualar o poder de representatividade conquistado pelo Rei, especialmente se levarmos em conta o mundo de ontem em relação ao de hoje.

Texto: Tauan Ambrósio/Goal.com